Os olhos são a janela da nossa alma
Costumávamos nos olhar nos olhos por minutos intermináveis. Nesse espaço de tempo que nada sabe de referências, conversávamos em profundo silêncio. Confessávamos nossos medos, nossas expectativas, nossos desejos. Nossos olhos descreveiam com precisão as pequenas alegrias que sentiamos naquele breve momento. Nossos olhos sonhavam juntos com a vida que queríamos ter: uma vida que durasse para sempre.
Eu finalmente encontrei o amor e ele estava dentro dos seus olhos.
Nós rimos, choramos e amamos através dos nossos olhos. Excelentes porta-vozes de nós mesmos, nossos olhos são honestos em relatar os últimos acontecimentos da guerra brutal que ocorre todos os dias dentro de nossos corpos frágeis. Uma guerra silenciosa. Nossos olhos descrevem o medo branco que rouba territórios dentro de nós. Nossos olhos gritam alto enquanto o joelho do racista sufoca o pescoço negro da nossa alegria.
Nossos olhos choram profundamente quando um ataque de paixões incompatíveis explode em nossos peitos, transformando nossos corações em ruínas.
Na África, meus ancestrais foram batizados pelos europeus antes de embarcar naquele navio que os separaria para sempre de suas mães, pais, filhos, filhas e cultura. Fomos batizados porque nos disseram que não teríamos uma alma e, portanto, só tínhamos uma opção: aceitar Jesus Cristo e sermos escravos. Essa estratégia de sucesso criou um novo comércio, riqueza e nações ricas para os brancos. Para nós, essa desgraça criou estupro, tortura e nações pobres para os negros. Pois foi durante a escravidão que surgiu uma das mutilações praticadas pelos senhores brancos que considero a mais atroz: a retirada brutal dos olhos do escravo fugitivo. Assim, ele não poderia nunca mais reconhecer o caminho para a sua liberdade. Mas havia outra motivação para explicar tamanha covardia:
sem os olhos do escravo, o branco nunca mais teria que enfrentar o ódio, a força, a bravura, a ousadia, a busca incansável de vingança que transbordava continuamente do olhos daquele escravo como uma represa que se rompe no dia do dilúvio.
Nossos olhos não mentem.